Caetano Veloso, jovem aos 76: macrobiótica ou pacto com o tempo?
Luiza Sahd
25/07/2018 05h00
No próximo 7 de agosto, Caetano Veloso celebrará seus 76 anos de idade. Ou não.
Pela terceiro verão consecutivo, vejo Caetano Veloso se apresentar em Madrid. Como sempre, o compositor parece mais jovial que na última vez. Nesta, dividiu o palco do Jardim Botânico com os os filhos Zeca, Moreno e Tom no show Ofertório — que fez uma plateia tipicamente discreta aplaudir com força um funk de versos alexandrinos. Entre os fãs que se empolgaram com a performance de Tom Veloso no passinho, estavam Jorge Drexler e Pedro Almodóvar.
"É por causa da alimentação macrobiótica", responde minha mãe, prestes a começar uma palestra sobre os benefícios da alimentação saudável, usando a notória vitalidade do ídolo baiano como exemplo de sucesso da dieta milagrosa. "Caetano é macrobiótico" Fonte da informação: DataMãe.
Veja também
- Precisamos parar de falar "no meu tempo era assim"
- É só sinceridade: viva a grosseria europeia!
- Pode apostar: o trabalho é mais importante que o amor
Se tem a ver com macrobiótica ou se são fake news, importa menos. O fato é que Caetano está vivo como poucos artistas contemporâneos. Tão vivo que arrisca sambar e a não disfarçar bem o susto de ver os filhos tocando, cantando ou dançando músicas compostas para eles quando pequenos ("Boas-Vindas", para Zeca; "Oração ao Tempo" para Moreno).
Ainda que não sejam grandes entusiastas das entrevistas pautadas pela vida familiar, os Velosos deixam muita intimidade ali, esparramada pelo palco, para quem quiser prestar atenção: os versos "Eu não me arrependo de você (…) Vi você crescer/ Fiz você crescer/ Vi cê me fazer crescer também para além de mim", dedicados a atual esposa Paula Lavigne — que foi ex-esposa durante 11 anos — não devem ser algo fácil de dizer diante de sei lá quantas gringos. É no palco também que Caetano evoca a mãe, a irmã, a ex-mulher Dedé (mãe de Moreno) e tantas histórias íntimas dele e de todos nós ao longo de mais de 50 anos e 50 discos de carreira. Se isso não é ser trabalhador, não sei o que pode ser.
De maneira mais ou menos misteriosa, Caetano é o artista idoso que mais se afasta da aposentadoria com o passar dos anos. Arrisca funk agora, já se aventurou com rap nos anos 1990, com rock no começo dos 2000, andou escrevendo música com expressões tipo "abraçaço", "mega bom, tera bom, giga bom", gritou em 2012 que ele é foda e a bossa nova também… Vai saber o que Caetano pode tirar da manga em 2020 ou 2030.
Assistir Ofertório sem sentir impulso de procriação é um desafio intenso. A coisa mais reconfortante do espetáculo é verificar que não existem dois Caetanos mas já temos um Moreno, um Zeca e um Tom entre nós — para além do dado de que a vida sempre continua. E que, por sorte, temos o homem que jamais terminou um raciocínio com "ou não" (maior mito sobre Caetano) para ajudar a gente na tradução dela.
Haters dirão que é um feito muito fácil para quem vira notícia até quando estaciona o carro no Leblon; eu digo que isso seria pretexto perfeito para ficar parado vivendo de glória… Mas nem o tempo corre rápido o suficiente para segurar Caetano Veloso.
Se for coisa de macrobiótica, começo a dieta amanhã.
Sobre a autora
Luiza Sahd é jornalista e escritora. Colaborou nas revistas Tpm, Superinteressante, Marie Claire e Playboy falando sobre comportamento, ciência, viagem, amor e sexo. Vive entre São Paulo e Madrid há anos, sem muita certeza sobre onde mora. Em linhas gerais, mora na internet desde 2008.
Sobre o blog
Um lugar na internet para falar das coisas difíceis da vida -- política, afeto, gênero, sociedade e humor -- da maneira mais fácil possível. Acredita de verdade que se expressar de modo simples é muito sofisticado.