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Luiza Sahd

Aos 80 anos na balada: sua opinião sobre o que é envelhecer pode mudar

Luiza Sahd

01/02/2019 04h00

"Devagar e sempre na balada", diria o espanhol idoso médio (Colagem: Reprodução/ fuentes_studio)

Desde que cheguei em Madrid, em 2015, passei a desconfiar que os idosos brasileiros estavam fazendo algo de muito errado com suas vidas. Meus avós foram sujeitos moderados na zoeira. A avó que está viva e ótima, com 87 anos, frequentou o Baile da Saudade até os 70 — quando a osteoporose fez com que a dança virasse esporte radical para ela. Eu já achava isso vanguarda demais.

Chegando na capital espanhola, veio o choque. Por algum motivo misterioso, todos os bares da cidade têm mesas ocupadas por um percentual surpreendente de idosos. Eles comem um monte de frituras, bebem, fumam — sabe-se lá o que fazem além disso em espaços privados — e não morrem tão cedo: a Espanha ocupa o quarto lugar no ranking mundial de expectativa de vida (82,9 anos), atrás apenas de Japão, Suíça e Singapura.

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Não sei como os velhinhos do Japão, Suíça e Singapura se comportam, mas os espanhóis se comportam mal. Apesar disso, a previsão é de que, até 2040, os espanhóis assumam a ponta do ranking com fantásticos 87,4 anos de expectativa de vida. Bebendo, fumando e comendo tapas (pão com alguma coisa não muito nutritiva) — ao invés de jantar uma sopa quentinha ou, sei lá, uma comida de verdade. Já mencionei que aqui faz muito frio? Se não mencionei, aqui faz frio demais: uma madrugada normal em Madrid, durante o mês de fevereiro, tem mínima de – 2 °C ou – 3 °C. Os velhinhos ficam no sereno, literalmente.

Nunca esqueço da vez em que fiquei hipnotizada por uma senhora com idade para ser minha avó que passou um show inteiro rebolando com mais disposição que eu teria, aos 20, em uma micareta. Eu estava sinceramente admirada e um pouco preocupada pela saúde dela até tomar uma bronca de uma amiga (que ficou surpresa com a minha surpresa). Tentei explicar que os avós de metrópoles brasileiras eram mais de ficar em casa jogando baralho ou assistindo televisão na sexta à noite. Ela não entendeu nada. Provavelmente, também vai viver esses 80 e muitos anos aí porque nem cogitou que a "velhice" era o momento de se retirar da vida social ou da malemolência.

Existem algumas teorias para explicar a alta expectativa de vida espanhola. Entre elas, está a dieta mediterrânea (rica em azeite de oliva, vinho e verduras), o ritmo de vida mais lento (já que os espanhóis idosos ainda são adeptos da siesta) e a própria arquitetura das cidades — que faz com que as caminhadas sejam mais convenientes do que o uso de meios de transporte motorizados.

Não há dúvidas de que os fatores acima contribuam para que os idosos espanhóis vivam mais, mas o intrigante sobre "viver mais" é que nem sempre ele é sinônimo de viver bem. Uma coisa que se pode afirmar sem medo dos espanhóis é que eles fazem questão de viver enquanto estão vivos. Não têm vergonha da idade, dos seus corpos, das rugas e nem medo de bater um papo passando por antiquados.

A coisa mais bonita da velhice nesse lugar é que ela não é — ou não parece ser — um estágio pior ou melhor do que a juventude. Intuo que os velhos espanhóis invadem os bares porque estão aqui e agora ao invés de chorarem abraçados a um passado que já não podem viver. O sereno, as frituras, os cigarros e as biritas devem ser o de menos: difícil, mesmo, é estar a fim de viver. E como eles estão!

Se eu chegar aos 80, espero lembrar destes senhores e não dar vexame fazendo tricô em casa no sábado.

Sobre a autora

Luiza Sahd é jornalista e escritora. Colaborou nas revistas Tpm, Superinteressante, Marie Claire e Playboy falando sobre comportamento, ciência, viagem, amor e sexo. Vive entre São Paulo e Madrid há anos, sem muita certeza sobre onde mora. Em linhas gerais, mora na internet desde 2008.

Sobre o blog

Um lugar na internet para falar das coisas difíceis da vida -- política, afeto, gênero, sociedade e humor -- da maneira mais fácil possível. Acredita de verdade que se expressar de modo simples é muito sofisticado.