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Luiza Sahd

O que é pior para o homem: limpar privada ou fazer xixi sentado?

Luiza Sahd

19/07/2018 05h00

Foto: Reprodução/ Toilet Paper Magazine

Será que o homem sabe o que é ser homem? De cara, só posso desapontá-los dizendo que não tem resposta pronta para essa pergunta aqui, mas, ao longo de toda uma vida, a gente reúne evidências de que tem muita gente equivocada sobre gênero por aí.

Adoro pensar em gênero porque estou fora da escola e, aqui, ainda não é proibido tocar no assunto (embora eu quisesse ter aprendido certas coisas antes de me relacionar com homens). O caso é que andam falando por aí sobre um festival de homens hétero que curtem homens — também conhecidos como g0ys ou heterog0ys. Fiquei me perguntando por que eles não se dizem bissexuais, por exemplo. Eles alegam que não são bi porque não curtem penetração com rapazes — apenas brincadeirinhas sacanas.

Numa dessas, a gente não sabe nem por onde começar a explicar que a definição de bissexual trata da atração por ambos os gêneros, com ou sem coito. Eles continuam achando que o B do LGBTQ é broderagem e a gente continua vivendo essa mentira que é: "não existem bissexuais, sexo com homem é coisa de viado".

Outro assunto muito interessante é esse aí. Sabe o que realmente é coisa de gay? Não sentir atração por mulheres. O resto todo é opcional, inclusive ser feminino.

Toda vez que pergunto a um cara se ele já ficou com outro, gosto de observar o olhar de desconcerto que se abate sobre eles. É como se eu os estivesse "acusando" de serem mulheres, porque quando você pergunta a uma mulher se ela já ficou com outra, um "sim" não pega tão mal.

E sabe por quê pega mal? Porque parecer mulher é socialmente mal-visto. O problema dos gays não é gostar de homens. Eles sofrem sempre e quando manifestam comportamentos femininos e é por isso que a luta LGBTQ não deveria nunca se afastar muito da feminista (e vice-versa).

Como sei disso? Vou dividir minha intimidade aqui, com licença.

Se você é mulher e morou com um cara, já deve ter se irritado limpando privada. Quem mija em pé só não permite que micropartículas de urina se espalhem pelo vaso se tiver poderes paranormais. Em qualquer outro caso, este vaso que recebe mijo em pé vai ficar fedido em pouquíssimos dias sim.

Como pessoa que faz suas necessidades sentadas e que limpa a propria privada pessoalmente, pedi que meu companheiro mijasse sentado porque eu não vencia manter o banheiro sem odores de WC de posto de gasolina por mais de três dias. Com esse pedido, aparentemente, provoquei falha na Matrix dele.

O cara não é nada machista e escutou meus argumentos com atenção, achou razoável mas continuava mijando em pé porque eu não sou boba. Ele assumiu que sim e propus, então, que caso ele se sentisse muito mulher por mijar sentado (?), ele poderia mijar como achasse mas cômodo mas assumiria a limpeza do WC no meu padrão de higiene — que eu também era usuária daquele espaço.

Ele preferiu mijar sentado sabe por quê? Porque a única coisa mais degradantemente feminina do que um homem mijando sentado seria um homem esfregando a privada que usa.

Ao que tudo indica, a definição do que é ser homem não existe, assim como a de ser mulher. O que a gente tem usado para se nortear sobre o que é ser homem tem sido um critério pobre e errado: ser homem é não fazer coisas de mulher. Se eu começar a listar aqui o que homens entendem por coisas de mulher, a gente não termina nunca esse papo.

Se você é homem e tá difícil entender por que um gay também é um homem, talvez precise de uma boa e longa reflexão sobre o que é ser um. Nem o mais afetado dos meus amigos gays (ah, o afeto!) deixou de ser homem por um minuto sequer da existência dele, tenho certeza.

Como estou deslocada do meu lugar de fala, escuto homens a respeito. Se puderem falar sem violência (outra característica erroneamente lida como masculina), escuto com atenção redobrada.

No mais, gostaria de agradecer de coração a todos os homens com quem convivo que não têm medo de parecerem mulheres. Com isso, vocês me ensinam que ser mulher não é algo ruim, feio, imoral ou menor do que ser um homem. É  – ou deveria ser – apenas diferente.

Sobre a autora

Luiza Sahd é jornalista e escritora. Colaborou nas revistas Tpm, Superinteressante, Marie Claire e Playboy falando sobre comportamento, ciência, viagem, amor e sexo. Vive entre São Paulo e Madrid há anos, sem muita certeza sobre onde mora. Em linhas gerais, mora na internet desde 2008.

Sobre o blog

Um lugar na internet para falar das coisas difíceis da vida -- política, afeto, gênero, sociedade e humor -- da maneira mais fácil possível. Acredita de verdade que se expressar de modo simples é muito sofisticado.