Como caí nas garras da autoajuda
Antecipando qualquer eventual dúvida do leitor, este texto é de autoajuda. Portanto, se você odeia autoajuda, pode ser que isso aqui te irrite um pouco. Eu mesma me irritava, porque estudei Letras e achava um absurdo o volume de vendas desses livros em relação ao que a gente chama de literatura de qualidade, cânone ou qualquer nome metido a besta de sua preferência.
Uma figura que me intrigava especialmente era Paulo Coelho, porque sempre que conversava com algum estrangeiro sobre literatura, acabava evangelizada por ele sobre a importância de seguir a própria lenda pessoal, entre outros conselhos típicos do Paulo Coelho. Eu já tinha lido "Veronika Decide Morrer" em alguma altura da adolescência e não achei nada do livro, mas deve ter sido porque, naquele tempo, não sabia ler Paulo Coelho de verdade.
Há três anos, tinha eu um livro para escrever sem grandes pretensões artísticas (até por causa do assunto, que seria muito esquisito um livro estilisticamente pretensioso sobre… inteligência canina). Moleza, né? Pesquisa e escreve. Mas um livro é um livro e eu não encontrava minha voz para explicar coisas triviais sobre como a observação das fezes da cachorra aqui me ensinou sobre a saúde dela e tal. Eu tinha um prazo e nenhuma ideia. Eu precisava relaxar. Precisava de uma leitura light. Eu fui ler "O Alquimista".
Deus me livre de entrar na análise de "O Alquimista" neste espaço modesto, mas faço questão de dizer que poucas pessoas no mundo sabem contar uma história sem floreios como o Paulo Coelho faz. Inclusive, estou lendo a biografia dele e pratico o famigerado grifo reverso — ao contrário do que faço com meus autores favoritos, quando leio Paulo Coelho, grifo só o que me parece ruim. Todo o resto é importante para que eu aprenda a escrever de forma clara e direta.
Bom, mas "O Alquimista" foi só a porta de entrada para lances mais pesados. Você não fecha um livro do Paulo Coelho e sai escrevendo o seu como se estivesse escovando os dentes, então recorri ao "Big Magic," da Elizabeth Gilbert, aquela senhora que escreveu "Comer, Rezar e Amar" e AMEI o filme por motivos de Julia Roberts. Bom, mas desta vez, Liz Gilbert falava sobre a diferença entre ser criativo e depender da criatividade para pagar o aluguel. Eu realmente poderia fazer um Ted Talks agorinha sobre a importância do "Big Magic" e sua autora na minha vida, mas vou dar uma resumida porque ninguém é obrigado (a).
Lembrei de Liz Gilbert e Paulo Coelho essa semana porque duas pessoas diferentes vieram me pedir conselho sobre como viver do trabalho de escritor. É uma excelente pergunta porque ainda não descobri, mas reparei, depois da autoajuda toda, que eu poderia fazer qualquer tipo de trabalho no mundo e continuar escrevendo porque sim, porque passo bons momentos escrevendo. E porque posso publicar e tudo bem se ninguém ligar — ou até se alguém esculachar, como acontece muito aqui embaixo, na caixa de comentários. Os maiores erros das pessoas criativas, na minha irrelevante opinião, são dois. O primeiro e mais importante é o cinismo ("não vou passar pelo ridículo de produzir ou consumir arte ruim"). O segundo é que muitos desistem da criatividade quando ela não serve diretamente para suprir necessidades práticas, tipo pagar o almoço de amanhã.
É isso mesmo que você leu: você pode escrever ou desenhar ou fotografar só porque é gostoso, quando tiver um tempinho. Você pode até tentar ganhar dinheiro com isso. O que você não pode é deixar de gostar de uma coisa porque ela não é o seu pão de cada dia. Se fosse assim, eu deveria odiar a Britney Spears porque ela só me faz perder tempo rebolando quando eu poderia estar lendo um livro considerado bom.
Se o que está escrito aqui servir como autoajuda para alguém, vou ficar feliz e esperar o tsunami de euros na minha conta corrente — essa sim, muito castigada pela mania de tentar misturar sustento e prazer.
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