Todo dia um "peguei anão no colo achando que era criança" diferente
Fazia um bonito fim de tarde na praia de Camburi (SP) em fevereiro de 1999. Eu e minha melhor amiga jogávamos frescobol à beira-mar. O pôr-do-sol era tão convidativo à pratica de esportes de verão que um senhor de meia-idade também corria pela praia com um sorriso despreocupado no rosto.
Como muitos já sabem e o matemático Edward Lorenz avisou em 1963, o bater de asas de uma simples borboleta sempre pode influenciar o curso natural das coisas e, assim, talvez provocar um tufão do outro lado do mundo. Foi meio isso o que aconteceu ali, 36 anos depois, quando pensei, na praia, "agora vou caprichar no saque!" ao mesmo tempo em que o homem pensou, na praia, "agora vou passar correndo por esse cantinho aqui". O sorriso do senhor que praticava jogging foi desmontado por uma bolada na cara com velocidade vertiginosa. Autora do crime: eu.
A tentativa de prestar socorro à vitima foi frustrada porque infelizmente tenho um problema congênito (herdado da minha mãe) de rir sem parar quando fico extremamente constrangida ou irritada.
— Senhor, mil desculpAHAHHAAHHAAHAHAH… O senhor se machucHAHAJAAJSSDFDFSHJDFSHJDSHJAHAHAH… Não foi minha intençJAAJASKJASFDJSFHJFSJHFHFGH
Aparentemente, a situação não tinha como piorar, mas piorou, porque minha amiga começou a rir do meu nervoso enquanto o homem tentava se orientar e ia ficando cada vez mais ofendido. Não existe gargalhada mais gostosa do que a da cumplicidade com melhores amigos na adolescência, de modo que rimos tanto, tanto… que literalmente começamos a fazer xixi na calça e tivemos que entrar correndo no mar, deixando o corpo do corredor (vivo, ufa) para trás.
Existem dois tipos de pessoas no mundo: as que têm pouca iniciativa de modo geral e as que passam vergonha sem parar. Falar já é um dos gestos mais arriscados que existem, repara aí. Seus amigos introvertidos provavelmente não cometem, em um ano, 10% do volume de papelões que você produz cada vez que sai de casa para qualquer coisa, mesmo que seja só uma ida até a esquina para comprar cigarros.
Se além de falante, seu caso é de ser gestualmente expansivo, pode ser que o sucesso e a fama não cheguem graças ao seu talento artístico, técnico ou intelectual, mas por situações como a enfrentada pela baronesa britânica Michelle Mone, que participou de uma conferência no Vietnã em maio de 2016 e pegou um anão no colo achando que era uma criança.
Michelle não só fez uma presepada pública sem querer como ainda tomou um esporro da esposa do anão, que se levantou dizendo "coloque este homem no chão. Ele é meu marido!". Ela se desculpou publicamente usando suas contas de Twitter e Instagram, meio fazendo piada, meio "queria estar morta". O rapaz em questão, Nguyen Tan Phat, de 22 anos, disse em entrevista que perdoou a gafe.
Pode ser essa mesmo a prova de que dinheiro não compra a felicidade: quantos milhões será que a baronesa pagaria para evitar ter passado por essa? Quantos você pagaria por não ter dado um like sem querer no Instagram que xeretava secretamente? Ou por jamais ter tentado passar o Bilhete Único por dois minutos na catraca da firma? Ou por ter respondido distraidamente "não, obrigada" a alguém que te pedia dinheiro e até mesmo por nunca ter mandado beijo no telefone depois de completar o pedido de delivery?
Difícil dizer, mas pode ser que algum dia, em algum lugar, alguém te ame exatamente por isso. Uma vez, me apaixonei por um cara que tropeçou 3 vezes durante um encontro de umas 3h, justamente porque em nenhum caso eu passaria mais vergonha do que ele na rua. Não foi recíproco, mas fica o consolo e os risos nervosos: a vida é esse eterno retorno de tropeçar em câmera lenta enquanto tentamos agir naturalmente.
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